terça-feira, 7 de março de 2017

saldo final da apoteose

enquanto há samba, a festa continua

Salve salve galera!
Sim, sabemos que é um tanto quanto tardio tocar neste assunto, porém segue uma análise sobre o carnaval na Sapucaí, feita pelo nosso querido Diogo Jerônimo.
Ele já tinha me pedido pra falar sobre o enredo da Imperatriz Leopoldinense (muito polêmico por sinal e tal polêmica se refletiu em sua avaliação, como vocês lerão), porém não tivemos tempo hábil nem inspiração para tal. Assim, pedimos ao amigo um parecer para poder publicá-lo com os devidos créditos evidentemente.
Assim, é com imenso orgulho e prazer que abrimos mais uma vez um espaço para nossos leitores discorrerem suas impressões e esperamos que os leitores gostem do texto. Como de hábito, deixem seu comentário ao fim da leitura a fim de entendermos os fatos e espalhem o link por aí.
Aquele abraço moçada!!!



SALDO FINAL DA APOTEOSE
Diogo Jerônimo*


Salve aos mestres!!!
Em meio a intervenções da Rede Horror de Televisão, polêmicas (inevitáveis) e tentativas nem sempre saudáveis de inovação, as escolas de samba da terra de São Sebastião pisaram novamente a Marquês de Sapucaí. Entre enredos e desfiles chamativos, algo novo para o espetáculo: acidentes, que se abateram sobre o público, e sobre as próprias agremiações, já evocando uma recomendação do INMETRO acerca de segurança para os próximos carnavais. Sobre esses, havia ainda algum ânimo para a continuação do espetáculo? As burocracias para a segurança dos carros foi atendida? Não será talvez uma boa hora para repensar o gigantismo das alegorias, comuns nos desfiles dos últimos anos?
Enfim, esse metido a observar (e curtir) esse grandioso espetáculo passa suas impressões do que assistiu. Ao contrário do ano anterior, os desfiles tiveram pontos altos e baixos nos dois dias, de forma que acho melhor particularizar pelas apresentações:
- Paraíso do Tuiuti: A agremiação de São Cristóvão falou de forma colorida dos 50 anos da Tropicália. Passou com bom samba, Wantuir soltando a voz, boas alegorias, mas prejudicada por ser a primeira escola do primeiro dia. Ainda pesou contra a agremiação os problemas no último carro, que além do acidente, estragou a evolução final;
- Grande Rio: Falar de Ivete Sangalo remete a grande quantidade de artistas globais e celebridades, e ao fato da homenageada ser a maior representante do movimento que maculou as origens do samba nos anos 1990. No fim, a escola de Duque de Caxias passou solta, alegre, elétrica como o trio, mas com samba extremamente acelerado que afetou a bateria, alegorias grandiosas, porém óbvias, e uma velada tentativa de comprar os jurados pela simpatia inesgotável da baiana. Muito barulho, pouco samba. Passou bonita, mas o desfile das Campeãs foi um exagero;
- Imperatriz: O enredo mais polêmico e discutido do Carnaval desse ano, acerca da intervenção do agronegócio nos hábitos, costumes e mesmo no habitat dos indígenas da reserva do Xingu (lembrar que uma exaltação ao agronegócio foi enredo da Unidos da Tijuca em 2016, na homenagem à cidade de Sorriso). Cahê Rodrigues trouxe para a avenida alegorias imponentes, harmonia sincronizada, poucos buracos em nível de evolução. O samba foi ótimo, e Lollo mostrou que a bateria da Imperatriz volta a impor respeito. A nota baixa, talvez o intérprete (Arthur Franco), que apesar de bom, estava tímido (Estandarte de Revelação?), seu canto quase sumindo entre os demais intérpretes da escola. Mas no geral, a escola merecia voltar no desfile das Campeãs;
- Vila Isabel: O enredo sobre a presença negra na música foi até bem contado, mas faltou maior capricho na organização e detalhes. A escola cantou bem, mas o samba (um dos melhores de 2017, com passagens emocionantes) pareceu sumir no meio do desfile, apesar da ótima bateria. As alegorias eram impactantes pelos efeitos, boas fantasias, mas ainda perdendo para as grandiosas dos desfiles de 2012 e 2013. Foi um enredo que começou empolgante, mas sem fôlego no fim. A Vila anda precisando de nova reformulação;
- Salgueiro: Talvez eu tenha ficado mal acostumado com o hipnótico desfile de 2016, mas esperava mais da Academia. As alegorias tinham impacto pelas cores, mas quando não assustavam (falar da Divina Comédia de Dante é difícil e perturbador mesmo), não tinham a picardia e boa elaboração do último carnaval. As fantasias não comprometeram, mas igualmente sem a provocação irreverente de 2016. O samba simplesmente não pegou, apesar de que a harmonia funcionou e a bateria de Marcão brilhou como sempre. O terceiro lugar talvez tenha sido um bom presente para a agremiação;
- Beija-Flor: Igualmente esperava mais da princesa nilopolitana, mas por motivos diferentes: a escola, tradicional pelo ajuste de suas apresentações, misturou excesso de cores em seus setores, dificultando a leitura do enredo indígena sobre Iracema de José de Alencar. Sem a presença de alas, pareceu por instantes que a escola estava mal vestida, com alegorias óbvias. Salvou-se pela bateria, pelo grito da comunidade, por Neguinho da Beija-Flor, e claro, pelo seu excepcional samba, com razão, o Estandarte de Ouro de Carnaval;
- União da Ilha: Ao lado da São Clemente, Imperatriz e Mangueira, o melhor enredo desse carnaval. E com boa inovação, a Tricolor passou como nunca vi: alegorias enormes, bem acabadas, leitura de enredo simples (inédita abordagem dos enredos afro, sobre as origens do tempo nas tradições bantus de Angola!!!). Ao lado do belíssimo samba, o refrão poderoso (e de belo significado),o intérprete Ito Melodia sempre forte, a Ilha sacudiu a Avenida. Não fosse a complicação com o último carro, que "matou" a evolução e gerou correria para evitar o estouro de tempo, poderia ter voltado no desfile da Campeãs;
- São Clemente: Não houve desfile mais injustiçado nesse Carnaval. A escola de Botafogo não empolgou a plateia, mas estava claro que a comunidade tinha o samba na língua, a harmonia excelente, ajudada pelo bom intérprete e pela bateria firme. Na estética da mensagem sobre os golpes na realeza francesa, nova aula de Rosa Magalhães, lembrando seus carnavais na Imperatriz dos anos 90: fantasias luxuosas, alegorias bem acabadas e brilhantes, e o que é mais interessante, carros alegóricos não gigantescos, que facilitaram a evolução da amarelo e preto. O resultado foi um desfile dos mais sem erros, compacto, componentes brincando o Carnaval... merecia retornar ao menos no desfile das campeãs. Como diferença de desempenho com a União da Ilha, o fato de ter justamente desfilado sem erro visível;
- Mocidade: Um dos dois desfiles de fato preparados para ganhar o Carnaval 2017. A Verde-e-Branco de Padre Miguel retornou ao seu estilo vencedor: escola brilhante, carros enormes, suntuosos e bem acabados, com fantasias de alto bom gosto para falar do Marrocos. A comissão de frente, pela sacada do Alladin fugindo no tapete voador via drone, foi um show à parte (mais criativo que os empregos de drone anteriores). No que se refere à musicalidade, um adendo: foi em minha modesta opinião, com sobras a melhor interação musical (intérprete + samba + bateria + harmonia) que pisou a Sapucaí esse ano. Wander Pires mostrou que é ainda um dos melhores intérpretes, a bateria de Padre Miguel seguindo suas tradições, o samba gostoso de cantar junto com a escola, que entrava e cantava em uníssono, sem nenhum timbre fora do lugar. A estrela da Vila Vintém de volta ao seu brilho singular!!! Vivendo um sonho das mil e uma noites!!! Poderia perfeitamente ter levado o título;
- Unidos da Tijuca: Um desfile para se esquecer da escola do Borel. Fora o acidente que causou problemas para a escola (e que gerou uma parcialidade escandalosa dos jurados e mesmo da LIESA, vide a virada de mesa), o enredo acerca da música americana já tinha tendência ao cansativo. O samba não ajudou por isso (a Vila Isabel foi mais feliz), e a perfeição técnica de outros anos foi totalmente comprometida pelo acidente, quebrando evolução, harmonia e no fim, atrasos que tiraram décimo da escola. Para se esquecer...;
- Portela: Talvez seja polêmica minha colocação, mas lá vai: apesar de muito feliz pelo fim do jejum da escola de Clara Nunes,o desfile desse ano perde em quase todos os quesitos aos desfiles entre 2014 e 2016. A bateria de Nilo Sérgio sempre funcionou em alto nível, mas a harmonia não pareceu tão entusiasmada. O samba foi um dos mais cantados do ano, mas com exceção do refrão forte ("Quem nunca sentiu...") o restante do samba pareceu cansativo na Avenida (será que Gilsinho de fato era "segurado" pelo Wantuir?). Por outro lado, as alegorias nem estavam tão revolucionárias como em 2016, e nem de acabamento tão perfeito quanto em 2014. Enfim, pareceu que a Majestade do Samba se aproveitou dos erros mais frequentes de suas concorrentes para, no "não erro", crescer na apuração, e encerrar o incômodo jejum ao fim, falando sobre os rios. Sob esse aspecto, parabéns linda Portela!!!;
- Mangueira: Ao lado da Mocidade, o desfile desse Carnaval feito para ganhar. O samba lindíssimo, a interação da bateria e da harmonia sempre robusta, Ciganerey novamente inspirado. E um desfile beirando entre o emocionante e o próximo da perfeição: alegorias ultra evocativas do enredo sobre a religiosidade e misticismo do povo brasileiro, sem intolerância, com belíssimas imagens, fantasias riquíssimas e bem elaboradas (ótima surpresa o carnavalesco Leandro Vieira!!!). Algumas partes desse desfile podem perfeitamente ser marcadas como dos melhores momentos da Estação Primeira nesse século. Uma pena os erros pontuais, poderia levar o caneco, mas no quesito emoção e religiosidade, a Mangueira marcou os corações nesse Carnaval. Valeu Verde-e-Rosa!!!
No mais, para além do Especial:

·           Felicidade pela volta do sempre tradicional Império Serrano (e que volte para ficar!!!);
·           Reconhecimento a Unidos de Padre Miguel, como escola postulante ao Especial (já deveria ter ido lá, talvez sem o acidente com a porta-bandeira, tivesse chegado esse ano);
·           Ótimos enredos da Viradouro e da Estácio de Sá, mas que poderiam ter caprichado mais nos sambas (a Estácio, no intérprete também);
·            Admitamos: quantas preciosidades de samba-enredo não nos brindou o acesso A!!! Das escolas que acompanhei, posso falar que me empolguei com as composições de Império Serrano, Unidos de Padre Miguel, Império da Tijuca e Acadêmicos do Cubango. E o que é o grupo de Acesso, pela força das comunidades, cada vez mais tem a cara do que um dia foi (e deveria voltar a ser) o Grupo Especial.

No mais, fico no aguardo para as opiniões dos mestres sobre os desfiles desse ano. E viva às escolas de todos os acessos!!!
Li uma frase muito boa de um presidente de agremiação dos acessos inferiores: "Hoje, é campeão quem consegue colocar sua escola para desfilar!!!"
Viva as comunidades, viva o que ainda é o samba de raiz!!!
Abraços aos mestres!!!



*Diogo Jerônimo é estatístico


5 comentários:

Unknown disse...

Muito bom. Ainda não vi todos os desfiles mas gostei muito do desfile dá Uniao dá Ilha e achava que ela chegaria no desfile das campeãs.
A Mocidade eu vi um pouco e achei muito bom também (é um tema que, de certa forma, tem suas combinações com o carnaval).
O carnaval tem restaurado um pouco seus vínculos com a cultura negra (que estavam esquecidos nos últimos anos)
Vou rever o desfile do Salgueiro. O tema me pareceu interessante.

Unknown disse...

É... Rede Globo de Televisão.... Nota zero

Guilherme disse...

Gostei de ouvir no rádio os sambas do Grupo A durante o desfile da unidos de Padre Miguel e Inocentes de Belford Roxo, gostei muito do samba da Inocentes

Raphael disse...

Diogo comentando carnaval é covardia. A melhor análise que li.
Deixo uma pergunta: o que esperar de Paulo Barros na vila?

Diogo disse...

Mestre e professor Coitinho, acho que será ótimo para a Escola de Noel, que necessita de uma sacudidela (o desfile desse ano revelou isso). E ele é a pessoa certa: não precisa provar mais nada, já superou desafios extremos (venceu carnavais pela Unidos da Tijuca como escola de médio/pequeno porte, e devolveu a dignidade portelense com o título desse ano). Mas admito que me soou surpreendente a saída de Barros da Portela, uma vez que a Majestade do Samba no mínimo pretenderia defender o título daqui a um ano. E a mudança foi radical, embora de alto nível: sai a inovação de Paulo Barros, entra o estilo rico, estiloso mas tradicional de Rosa Magalhães. E as agremiações em movimento: após longo casamento salgueirense, Renato e Márcia Lage na Grande Rio. O Carnaval 2018 já começou!!!

Salve aos mestres!!!!