quarta-feira, 4 de maio de 2016

o fim de um império

sei que você hoje é bobo porque seu reinado já chegou ao fim

Salve galera!
Movido por um post de nosso caro amigo e alienista Bruno Timorato na segunda-feira, resolvemos escrever sobre o ocaso de um dos maiores desperdícios que o futebol já teve notícia nos últimos 20 anos.
O post dava conta de uma goleada sofrido pelo sofrível time do Miami United, um time da quarta divisão do futebol estadunidense. Este timeco apanhou em casa para o não-menos horroroso Miami Fusion por 5 a 0. Essa goleada não teria rigorosamente nada demais, nem mesmo seria levada em conta, não fosse um personagem que estava vestindo a camisa 10 do United. Personagem este que deve ter dado um alento aos torcedores do MU quando chegou ao clube, afinal trata-se de um futebolista brasileiro de renome, dos mais famosos do mundo. Entretanto, só se esqueceram de dizer aos torcedores e dirigentes do clube que trata-se, em verdade, dum ex-jogador em atividade.
Quando Adriano Leite Ribeiro estreou entre os profissionais do Flamengo, era um jogador tido como apenas mais uma promessa, como sempre acontece quando um garoto sobre pros profissionais. A recordação que temos desse garoto foi num jogo de Campeonato Carioca em 2000. Estávamos no Maracanã nesse dia, ou melhor, nessa noite. E o que nos chamou atenção, mais que o próprio jogo em si, foi um anônimo que estava na arquibancada, um senhor de idade que parecia demais com o saudoso Jorge Nunes, da Rádio Tupi. Até o boné era igual... Pois bem, este homem ficou durante o jogo inteiro gritando "Adriano, vai pra dentro da área, tu não sabe fazer tabela, pra que tá no meio-campo?". Lembramos que olhávamos pro distinto e ríamos, enquanto ele comentava, estilo Jorginho: "Porra, olha esse moleque, alto, massa bruta, todo desengonçado, tá fazendo o quê na meia? O lugar dele é dentro da área, vai por mim, na base ele era o centroavante... Caralho, vai pra área, filha da put@#$$a!!!" E ele berrava furioso contra o tal "moleque", quando este pegava na bola fora da grande área...
E o engraçado é que o anônimo estava coberto de razão. Porque Adriano dentro da área marcou duas vezes nesse dia. "Eu não falei??? Fica na área Adriano, que tu vai se dar bem, porra!!!", ele comemorava feliz da vida com a vitória do Mengo. A partir dali, começava a saga daquele centroavante "massa bruta" que foi o cara por alguns anos.
Adriano chegou a ser convocado para a seleção de base (recordamos de tê-lo visto na época do Sul-Americano conquistado pelo Brasil), onde brilhou, e depois de uma boa temporada em 2001, foi transferido para a Itália. E foi lá, num campeonato considerado muito difícil para jogadores mais habilidosos (por analogia, especialmente para os brasileiros), que ele conseguiu atingir um patamar impressionante e um status de craque que poucos conseguiram em tão pouco tempo. Primeiramente no Parma e depois, e em definitivo, na Internazionale de Milão, onde se consagrou como artilheiro, tendo conquistado diversos títulos e o epíteto de Imperador. Chamava a atenção por ser um centroavante de muita força e que levava muita vantagem no corpo-a-corpo. E o curioso: aquela crítica do velho do Maracanã, de que o atacante era "desengonçado", também perdera a razão de ser porque Adriano aprendera a se valer da força e da altura para ser um centroavante "rompedor", daqueles que se põem na área e não se param com facilidade. Ou seja, taticamente ele também evoluíra.
Foi quando a tragédia familiar se abateu sobre Adriano e estabeleceu o começo do seu fim em 2006. Depois da morte de seu pai, certamente um porto seguro para o jogador, o rendimento caiu drasticamente. Fez uma péssima Copa do Mundo em 2006 (mas houve outros culpados nisto, talvez um dia escrevamos acerca) e foi preterido na Inter (onde estava sendo questionadíssimo pelo clube e pelos torcedores por indisciplina e poucos gols), tendo ido parar no São Paulo, onde recuperou a forma e voltou a marcar gols. Porém, ao fim da participação do Tricolor paulista naquela Libertadores de 2008, seu retorno à Itália foi tímido e ele já estava enfrentando problemas com o álcool e indisciplinas. Até que finalmente em 2009 assumiu o problema com a bebida e saiu da Inter pela porta dos fundos, sem alarde.
Adriano não ficou muito tempo sem "a alegria de jogar futebol", como declarara numa entrevista. Pois o Flamengo resolveu repatriá-lo e ali, provavelmente, foi seu último grande momento como jogador de futebol. Ele se dedicou de corpo e alma ao clube, perdeu muitos quilos, procurou não se envolver muito em confusão (mas acabou tendo alguns ruídos no meio do caminho) e foi abraçado pela Nação (e por Andrade e Petkovic), que comprou a briga e o impulsionou novamente ao estrelato. Foi o artilheiro do Brasileirão daquele ano em que o Mais Querido foi campeão, eleito o craque do certame por diversas publicações esportivas e já era tido como certa sua convocação para a Copa do Mundo em 2010, na África do Sul. Enfim, um retorno triunfal do Imperador ao futebol. Porém...
O ano seguinte foi o oposto total de tudo que conseguira antes. Sua irresponsabilidade já atingia patamares absurdos. Adriano vivia visivelmente do que fizera em 2009. E a mesma torcida que o apoiou e que o pôs nos braços tratou de exigir sua saída, por entender que ele não estava mais honrando o Manto, nem respeitando o clube. Com a situação totalmente desfavorável e já totalmente descartado para a disputa da Copa em 2010, mais uma vez Adriano saiu pela porta dos fundos de um clube.
Foi nesse período conturbado em que esteve no Flamengo que várias estórias pipocaram aqui e ali. Algumas verídicas, outras nem tanto, mas todas dando conta de que Adriano tinha mais que simplesmente problemas de alcoolismo (que ele assumiu de vez anos depois). Era também a questão das péssimas companhias que o circundavam. Daquelas sanguessugas que sempre querem aparecer à custa de uma figura muito midiática que não tem pessoas sensatas ao seu redor para poder alertá-lo. São elementos que arrancam até o último centavo de uma pessoa, que mal sabe o que está acontecendo consigo própria, e que depois de vê-la caída sem nada mais que se possa aproveitar somem de sua vida sem deixar vestígios.
Lembramos que por muito tempo as pessoas diziam que o problema era o vínculo dele com a Vila Cruzeiro, local onde viveu por toda a vida e que era um dos bairros mais perigosos do Rio de Janeiro. Diziam que ele era colado com o tráfico, sendo amigo de traficante, etc. Nós sempre tivemos certa parcimônia quanto a isso. Porque esse tipo de vinculação, em muitos casos, era feito com base no preconceito por estar-se referindo a um local que faz parte do Complexo do Alemão, onde a maioria da população é pobre e passa por muitas dificuldades decorrentes da criminalidade e também por ser um daqueles logradouros onde não se há nenhum tipo de incentivo ou investimento.
Todavia, com o passar do tempo, aquela reserva que tínhamos com relação ao que escrevemos foi também se diluindo porque Adriano estava se envolvendo em estórias mui polêmicas, como o episódio em que teria queimado a perna (ou o pé) primeiro com uma lâmpada, depois com um escapamento de uma moto; depois, ele foi retratado empunhando uma arma (a mais polêmica de todas as polêmicas); até que finalmente se envolveu numa estranha confusão com uma então namorada no Ninho do Urubu. Em suma, Adriano parecia deixar claro que suas companhias também não eram das melhores. E isso independia de seu passado de garoto que soltava pipa nas lajes de seu bairro ou que batia pelada nas várzeas locais. Era ao mesmo tempo o preço da fama sendo pago e cobrando sua parte no acordo aliado a uma péssima orientação seja por familiares, seja por pessoas ligadas diretamente à sua carreira.
E o mais trágico nisso tudo é que ele não dava sinais de que tal estado de coisas era um incômodo sério. Pois a impressão que nos causava era de que ele estava disposto a não se desvincular dessas confusões, se afundando mais e mais nelas. Ele aceitava as piadas vindas de todos os lados e nem se importava mais em preservar sua fama de Imperador em áureos tempos. Tudo indicava que novamente e em definitivo ele perdera "a alegria de jogar futebol".
Com todos esses elementos, o ex-camisa 10 do Flamengo ficou sem mercado, uma vez que os clubes viam nele um potencial única e exclusivamente para confusões. E ninguém quer ver sua marca associada a problemas. Tite não agüentou o centroavante por muito tempo no Corinthians. A passagem pelo seu último clube no Brasil, o Atlético Paranaense, foi como se nem tivesse ido pra lá. E assim, ele se limitou a ir para clubes sem nenhuma expressão, ele que até pouco tempo era presença obrigatória em qualquer clube mundo afora. Tantos europeus que se dispuseram a ofertar jamantas de euros ao atacante que hoje em dia não vale uma cestinha de supermercados de reais...
E assim, ele foi rodando clubes de quarta ou quinta categoria mundo afora até parar nesse tal de Miami United. Imaginamos a recepção: muita festa, muita badalação e tals. Afinal, para aqueles ianques, ele ainda é o Adriano que conquistou o mundo com gols e o tetra na Itália, o centroavante rompedor da selenike, o grande matador. Isso porque apesar de todos os pesares, certos locais ainda têm aquela imagem positiva do ex-craque e avaliam que ele não desaprendera a jogar bola. E como em terra de cego quem tem olho é rei, era evidente que ele sobraria na turma, assim indubitavelmente pensaram os dirigentes do United.
Ledo engano pelo menos por enquanto. Pois com o brasileiro em campo, a derrota foi somente de 5. O que nos fez projetar algo realmente "sombrio" para Adriano. Pois com Bebeto aconteceu algo assim. O camisa 7 do tetra foi badaladíssimo pro México já em franca decadência, mas obviamente não de forma tão negativa quanto o herói da Copa América de 2005. Pois bem, o tal time que ele foi defender (Toros Neza) tomou umas 3 ou 4 goleadas seguidas e ele só marcou 2 gols em toda sua estada por lá, o que não impediu o time mexicano de ser rebaixado. Resultado, saiu de lá quase que a socos e pontapés praticamente.
Estamos vislumbrando algo parecido para o ex-Imperador, pois o que mais ele pode oferecer de interessante num clube que faz parte duma confederação cujo campeonato não prevê subida ou descida de divisão, onde clubes compram sua estada em divisões, uma verdadeira e inequívoca liga de aluguel? Se ainda fosse um clube da MLS, que tem tido recordes de público, audiência e popularidade, ainda ia, mas nem isso! Adriano está condenado a morrer jogando na quarta divisão de um país onde o que realmente importa é jogar bola com as mãos!
Finalizamos o ensaio deste mês com essa triste constatação. Sem mais o que pensar no caso de um dos desperdícios mais tristes da história do futebol mundial. Um homem que teve o mundo da bola aos seus pés de forma meteórica, assim como também de forma instantânea viu seu império ruir graças às péssimas escolhas feitas por tantos e tantos anos. E pensar que em 2009, quando foi dado como acabado, ele foi o Imperador do Brasil. E pensar que hoje ele teria vaga fácil nessa patética selenike de Dunga, inclusive no lugar de Neymarketing, assim como tinha na selenike de 2010. Adriano protagonizou um indiscutível 7 a 1 imperial... Que gol contra horroroso!

Ficamos aqui pensando o que o sósia de Jorge Nunes diria de tudo isso. Como o mundo é muito pequeno, quem sabe ele não está lendo nosso texto agora? Se estiver, que saiba que ainda temos a recordação figurista daquela noite de vitória do nosso time no Maracanã: "Eu não falei??? Fica na área Adriano, que tu vai se dar bem, porra!!!"

5 comentários:

Raphael disse...

Se não acompanho o futebol carioca e brasileiro, muito menos o faço para o estadunisense... pelo pouco que sei, o major League funciona com franquias que se inscrevem (pagam) para disputar certas divisões (não correlacionadas entre si, ou seja não há ascensão ao vitorioso de uma divisão inferior ou queda para últimos colocados. Assim sendo, não vejo como "demérito" Adriano jogar uma tal quarta divisão.
Contudo, acho muito difícil este time ser bom ou mediano... Deve ser ruim pra caramba... De nada adiantaria um Zidane (um dos melhores que vi jogar) no meio de campo deste tal time...
Contudo ainda, fica uma critica ao futebol brasileiro que fez com que um dos melhores atacantes que vi, sair do país para jogar num mercado ainda inexpressivo.
Outra critica fica aos empresários que Adriano se relacionou... Verdadeiros vampiros.
Acho muito difícil dele voltar a jogar o futebol que tem, mas ainda assim, tenho certeza que ele merecia palcos e camisas mais nobres.

Unknown disse...

Salve Sanctus. É muito triste perceber a queda do Imperador. Nunca curti condena-lo pelas farras, mas ele abusou. Nesse mundo da eficiência e imagem, ele não teve vez. Eu me lembro que em uma entrevista ele disse que havia perdido a "vontade jogar bola". Neste dia eu passei a simpatizar ainda mais com ele, pois ali eu vi que futebol é muito mais do que carrões, marias chuteiras e sekenike. Adriano é um exemplo de que há pessoas no meio desse negócio e no dia a dia isso acontece mesmo. Pode parecer um desperdício? Sim, porque nós que gostamos de futebol e gostaríamos de vê-lo em seu auge para sempre. Ainda mais nestes tempos de 7 a 1. Eu confesso que assim como ele, perdi muito da boa vontade com o futebol. O futebol dos amigos, o revolucionário Havana Futebol e Cana está voltando, e Adriano será sempre bem vindo a jogar conosco quando ele quiser.

Unknown disse...

Raphael; eu acho que ele foi para lá para fugir um pouco da pressão daqui. É um grande caô que aquilo lá é futebol profissional. Ele deve ter um contrato para lavar dinheiro, e estar tentando melhorar fisicamente para conseguir algum bom contrato no Oriente Médio ou China e encerrar a carreira com mais algum no bolso. No Brasil, acho que nem se ele entrar para o AA ele consegue jogar num time de primeira.

Unknown disse...

Se mostra ai então a necessidade dos profissionais de futebol ao alcançar o sucesso profissional ou financeiro ter uma segunda opção.No caso específico do Adriano, acho que foram as drogas e o álcool que desestimularam o atacante. Concordo com Gabriel que a jogada dele era se afastar e tentar no final de carreira um contrato nos paises orientais mas teria que mostrar muito para tal.O fato é que a realidade dele se aplica a categoria.Aqui em nosso pais ser jogador de futebol é a esperança que muitas famílias jogam em cima de seus filhos para uma vida melhor sobrecarregando essas crianças que acabam chegando a adolescência e desistindo dos estudos por não ter alcançado o sucesso em times grandes.Com relação ao Bebeto,assisti uma entrevista dele em relação a sua estada no México.Além de criticar o país pela corrupção e drogas, ele foi vítima de violência pois teve seu filho sequestrado!!!

Diogo disse...

Mestre Jeférson, de início, parabéns pelo novo visual (ou é outro blog?), uma versão futebolística do Herméticas. Muito legal!!! Sobre o caso Adriano, o essencial o mestre já disse (de forma brilhante novamente), o que apresento são mais adendos ao que foi dito por ti e pelos demais professores:

- a Major League busca fazer com o futebol o sistema de franquias que funciona na NBA. Devido a esse modelo diferente, que centra mais em finanças que em tradições a estrutura orgânica dos clubes, ainda é nebuloso seu futuro. Atualmente, devido especialmente a resistência dos puritanos "yankees" com o "soccer", essas franquias fecham comumente suas contas anuais no vermelho, devido a isso é mais interessante para os mesmos trazer atletas em fim de carreira ou mesmo ex-jogadores para serem as estrelas;

- Liberalismos à parte, entendo que os novos jogadores deveriam ser instruídos a lembrar constantemente que a carreira de jogador de futebol é curta, então esses deveriam ser preparados para as alternativas pós carreira (formação universitária, investimentos em seguros e previdência, moradia, etc...) para que não vivessem na penúria em suas aposentadorias;

- Mestre Jeférson, faço questão de ser o primeiro a ler sua postagem sobre a Copa de 2006, se algum dia ela pintar. Motivo: entendo que foram os eventos dessa Copa que fomentaram de forma embrionária essa escassez técnica que vivemos no futebol atual. De forma ainda germinante, nascia depois daquele Mundial o 7x1 de 2014;

- Seria interessante também algum dia uma opinião sua sobre o Brasileiro de 2009. Não que tenha sido injusta a conquista rubro-negra, mas a verdade é que talvez nunca mais eu veja um panorama tão improvável para um clube ser campeão. Treze vitórias em quinze jogos, com um adversário dianteiro após o outro sendo derrubados em casa em resultados improváveis (a arrancada do Fluminense, as vitórias do Botafogo sobre o Internacional e São Paulo...). Um feito assombroso, só superado pela arrancada do Fluminense naquele mesmo ano, escapando da Segunda Divisão. Sobre o rubro-negro, méritos para Andrade, responsável direto pela recuperação de Petkovic e Adriano...;

- Não há como negar, de fato os clubes (falidos ou não) precisam "vender" uma benigna imagem, ainda mais nesses tempos em que apregoa-se a paz pelos quatro cantos... alguém empunhando um fuzil de forma "recreativa", e sendo visto enchendo a cara na Vila Cruzeiro não é um exemplo para as crianças... Adriano foi a meu ver vítima de uma falta de amparo terrível, em que os "amigos da onça" usaram e abusaram de sua imagem...;

- O nível do futebol está tão abaixo da crítica, que concordo com o mestre: ele teria vaga fácil hoje nesse timinho da Seleção... era só correr atrás, ele mesmo se submetendo a um policiamento de um clube que o quisesse em seu elenco... E ele conseguiria? Uma aposta arriscada, mas...;

- Para fechar o assunto Adriano, frase-resumo perfeita feita por Iata Anderson, comentarista da Rádio Tupi no Programa Bola em Jogo, em tempos de Doalcei Camargo e Jorge Nunes (que falta fazem!!!):

"Só tem uma pessoa que não gosta do Adriano: ELE MESMO!!!".

Abraços aos mestres!!!