terça-feira, 9 de agosto de 2016

O OURO DA SUPERAÇÃO, A EMOÇÃO DA HIPOCRISIA, AS VAIAS DA REVOLTA E O CARIOCA LESADO

Quando comentei os resultados da Copa do Mundo de 2014, escrevia sobre um único esporte e várias seleções. Nesta olímpiada escrevo sobre a participação brasileira em várias modalidades. Confesso que é mais difícil. Mas vamos tentar com o que faltou no texto passado.
A Ginástica Artística está de parabéns. Tanto no feminino quanto no masculino. Ficamos em sexto lugar por equipes no masculino, o feminino por equipes está na final e temos dois atletas de cada equipe nas finais individuais.
Já a condição do basquete feminino é de chorar. A seleção feminina acumulou duas derrotas, e nas duas com uma diferença significativa de pontos. E difícil de acreditar que há exatos 22 anos com um quinteto com Janete, Helen, Paula, Hortência e Marta, o Brasil era campeão do mundo e dois anos depois fora Vasc... quer dizer, vice-campeão olímpico, numa campanha memorável, a ponto da nossa melhor jogadora na competição passar a ser chamada de "Magic Paula". O caso e o ocaso do basquete brasileiro (de tantas glórias passadas, diga-se) deve-se a atuação da cartolagem, cuja gestão velhaca e corrupta fez com que o esporte da cesta deixasse de ser o segundo esporte na preferência nacional. Hoje as meninas do basquete estavam até ganhando da Belarus (antiga Bielorússia), mas passaram DEZ minutos, isso mesmo, dez minutos sem fazer uma única cesta. Pelo visto, não vamos nem nos classificar... E o masculino é o time do quase: quase vira, quase empata, quase faz cesta de três pontos. São todos bons jogadores, estão na NBA mas chega na seleção e... quase. Ahh, que saudades de Oscar, Marcel e cia... As vezes falta força mental a essa ótima geração. E tem dia em que ainda temos que jogar contra a arbitragem! Hoje, contra a grande seleção espanhola, o Brasil de novo quase... Perdeu. Foi por UM PONTO!!!!!!!!!! Mas a Espanha jogou muito mal hoje e nós poderíamos ter vencido com mais folga e sem passar por tantos sobressaltos.
A natação brasileira é outra que sofre com a cartolagem. O manda-chuva desse esporte lá está há quase trinta anos... Então se vive do surgimento de fenômenos de tempos em tempos. Depois da geração Scherer/Gustavo Borges e do fenômeno Cielo parece que vivemos tempos de entressafra. E corremos o risco de passar em branco em nossa própria casa.
O futebol masculino é outra modalidade que corre sério risco de ser eliminado na primeira fase. E dá um sonoro vexame nos gramados. A torcida perdeu a paciência com um time muito nervoso, sem esquema tático, com um técnico sem autoridade e sem recursos táticos. Parece que nem a seleção olímpica consegue escapar da ressaca do 7 X 1. Mais, Dunga se foi mas o futebol anacrônico que ele propunha parece ter impregnado as seleções masculinas de futebol.
O handebol feminino está em estado de graça. Nossas jogadoras fizeram hoje um partidaço. A vítima da vez foi a atual campeã mundial, a Romênia. Devolvemos a dolorida derrota que acabou com o sonho do bi mundial, e foi um passeio.  No masculino fizemos bonito na primeira rodada e vencemos a fortíssima Polônia por dois gols de diferença. Hoje, enfrentando os eslovenos, não fomos tão bem assim e eles nos venceram por 31X28. Vale dizer, não houve corpo mole e a torcida aplaudiu o Brasil ao final da partida.
O vôlei feminino não tomou conhecimento e venceu com facilidade as argentinas por 3 sets a zero. E jogou com muita seriedade. A seleção joga tão bem que dá até medo do dia em que jogar mal. O destaque negativo fica por conta do horário. O interesse comercial acima da necessidade do atleta. O Brasil jogará todas as suas partidas de vôlei (masculino e feminino, diga-se) até as semifinais no horário das 22:00h! Não gosto de teorias da conspiração, mas até parece até que tem gente na Federação de Internacional de Vôlei desejando a derrota brasileira no vôlei. Nas areias do Leme/Copacabana, os rapazes perderam seus jogos. Uma das duplas (Pedro Solberg e Evandro) perdeu a segunda partida e se complicou bastante para se classificar. As duplas femininas seguem invictas e venceram suas duas partidas. Será que teremos outra final feminina? E no vôlei masculino, uma nota para a maior zebra do masculino nessas olimpíadas. Campões olímpicos, os russos  foram derrotados pela Argentina, cuja torcida lotou o Maracanãzinho e deu um show, lembrando muito o que fizeram na Copa do Mundo de 2014.
Na vela, Robert Scheidt, competindo na classe laser, vive de altos e baixos e está em 8º lugar após 5 regatas. Talvez a medalha não venha...
E Rafaela Silva, traz a primeira medalha de Ouro para o Brasil nesses jogos de forma muito emblemática e carregada de simbolismos. O mais forte deles é uma questão de gênero. É a primeira medalha dourada em um evento onde as brasileiras parecem muito mais fortes e preparadas para jogar em casa. Futebol e judô que o digam.
O segundo simbolismo passa pela superação da atleta vítima de racismo porque foi desclassificada na olimpíada passada e hoje todos a enaltecem pela vitória. Não questiono a genuína emoção que muitos sentiram, mas há um quê de hipocrisia nisso. Hoje comemoram muitos que reforçam estereótipos e preconceitos de um país que não se assume como racista e preconceituoso com tudo aquilo relacionado aos negros, aos pobres ou que a origem esteja ligada à favela e à periferia. Tanto é verdade que coisa parecida ocorreu hoje na eliminação da nadadora Joana Maranhão. A diferença é que essa atleta posiciona-se muito claramente em termos políticos e, ao que tudo indica, essa postura incomoda a ponto dos covardes nas redes sociais se aproveitarem disso na hora mais dura para um esportista.
E tem o terceiro simbolismo, o de alguém que veio da Cidade de Deus (da região mais violenta, chamada de Coréia), tida por problemática, ganhar sua medalha em casa, há menos de dez quilômetros de casa. Esse é o resultado direto da sua vitória contra a pobreza. Mas não significa legitimar a tese que afirmar que todos que se esforçarem alcançarão a vitória. Isso não acontece com todo mundo, infelizmente. Muitos bons potenciais, em várias áreas, estão nas favelas e periferias, mas eles não chegarão ao topo por causa da falta de oportunidades, de infraestrutura em educação, por causa da violência e do preconceito.
A vitória de Rafaela Silva está diretamente liga as outras derrotas no judô. A política esportiva com vistas aos resultados de uma olimpíada em casa fez a equivocada opção por investimentos no chamado esporte de alto rendimento. O COB e as autoridades governamentais não foram capazes de produzir um programa de disseminação da prática desportiva. Foi assim que Austrália e China se tornaram potências olímpicas e que o Quênia despontou no Atletismo. Aqui no Brasil se fez uma opção elitista e perdemos a chance de nos tornar uma potência olímpica. E nem dava para virar mesmo em um país onde 6 em cada 10 escolas sequer possuem quadra de esportes... Assim sendo, quantas Rafaelas Silvas deixamos de ter??? Isso explica o porquê dificilmente teremos a quantidade de medalhas que o COB estabeleceu como meta.
Finalmente, não poderia encerrar esse texto sem mencionar minha descoberta e minha aventura hoje. Fui pegar uns ingressos que ganhei de presente hoje para competições que vou assistir amanhã. Como estava na Zona Norte da cidade, resolvi testar a história do acesso ao Parque Olímpico. A prefeitura e os organizadores dos jogos tem afirmado que para usar o metrô da linha 4 e os BRTs na Barra a pessoa tem que comprar um RioCard Olímpico (R$ 25 para usar um dia). TODOS  os turistas e muitos moradores da cidade estão gastando esse dinheiro todo e certamente não consomem nem a metade em passagens.
Pois bem, descobri várias coisas cuja a divulgação da prefeitura, dos comitês e da imprensa negligenciam. Primeiramente, meus ingressos eram para amanhã, mas ninguém conferiu data. Peguei o BRT especial em Vicente de Carvalho usando meu RioCard. Desci no terminal do morro do outeiro e verifiquei que não há bilhetagem na volta. Por isso, paga-se R$7,60 para entrar no BRT especial em Vicente de Carvalho (Peraí, mas e o bilhete único?). Lá verifiquei que tinha quiosques de alimentação. Em alguns deles falta comida depois de um horário. O pessoal do consórcio BRT está fazendo jornadas de doze horas diárias de trabalho... Com menos de R$15,00 não se come nada. E a empresa responsável pela alimentação nas praças esportivas dos jogos pertece ao neto e herdeiro do dono da Odebrecht. Isso lhe diz algo?
Só não entrei no parque olímpico porque o ingresso era para o Riocentro e a moça me "encaminhou para direção correta"... Resolvi voltar pela zona sul, já que moro em Botafogo. E entrei feliz da vida no BRT que ia para o Jardim Oceânico sem que ninguém me pedisse RioCard de quaisquer tipos. Ao chegar na Barra, desci para o metrô e... Bingo! Com meu Vale Transporte simples paguei a passagem de metrô e fui embora pra Botafogo feliz da vida...
Resumo da ópera: A prefeitura e a imprensa deliberadamente estão onerando a população e impedindo quando possível que turistas e moradores acessem o parque olímpico (creio que em Deodoro seja a mesma coisa) usando o vale-transporte ou RioCard. Para atender o interesse das empresas de ônibus e do metrô, que estão se locupletando em cima do público que está indo aos jogos, os responsáveis pelo evento (mídia, Prefeitura, COB, Concessionárias de transporte público) deliberadamente estão onerando a população e os nossos turistas. Mais uma vez fica evidente que nossos gestores (diga-se PMDB) organizam a cidade como se ela fosse uma mercadoria, colocando os interesses dos empresários acima do bem estar da popular. É complicado viver em um lugar com sensação de estar sendo assaltado pelo poder público o tempo todo...
Apesar da emoção que o esporte me provoca, pensar nisso dá muita raiva mesmo. Amanhã tirarei a prova dos nove. Tentarei ir pelo metrô da linha 4 até a Barra para ver as lutas de box. Relato depois minha experiência.


3 comentários:

Raphael disse...

Muito bacana o registro e impressões!

A.L.A.S. disse...

Perfeito Amigo Jorge (aqui é o Adney do IFRJ!! =D).

Sobre o investimento nabadesco e elitista que o governo imprimiu, vale lembrar outra nação que, com muito pouco de investimento, obtém grandes resultados: a Jamaica! E pensar que já tivemos velocistas finalistas de olimpíada, meio-fundistas campeões, e um revezamento 4 x 100 vice-campeão olímpico! Isso mostra que não basta apenas jogar dinheiro de forma elitista, pensar apenas em medalhas (e depois jogar toda a culpa nos atletas, caso elas não venham), sem pensar em criar uma nação olímpica de verdade!!

Jorge Alexandre Alves disse...

Adney, meu camarada. Quanta Honra ver seu comentário aqui no nosso espaço.
O caso das provas de pista do Atletismo dá até tristeza. Zequinha BArbosa e Joaquim Cruz estão nos EUA treinando em universidades, quando poderiam estar aqui, dirigindo a seleção brasileira.
Uma pena que perdemos uma grande oportunidade de nos tornamos uma potência olímpica. Outra chance dessa creio que somente ocorrerá quando eu, vc e todos da nossa geração formos uma mera lembrança do passado.
Grande abraço