DO CIRCO DOS HORRORES AO TEATRO DO ABSURDO
Jorge Alexandre Alves
Sobre essa farsa
sob o nome de impeachment, que até mesmo jornais conservadores como o "The
New York Times" e o "Le Monde" admitem ser, no mínimo, uma
ruptura com a democracia.
Sobre o estupro
de 54 milhões de votos que elegeram Dilma Rousseff em 2014.
Sobre o
retrocesso que já se abate sobre a sociedade brasileira. Poderia enumerar um
monte deles só na minha área de atuação profissional: A Educação. E nesse caso,
o estado do Rio de Janeiro governado pelo PMDB é uma bela amostra grátis do que
isso pode representar.
Sobre a patifaria
explícita que vemos em cadeia nacional, em que bandidos se arvoram de juízes de
uma pessoa honesta.
Sobre a falência
do Poder Judiciário, do qual eu já desconfiava há muito. E que hoje eu não
tenho a menor crença na sua idoneidade como Poder constituído da República. O
império da lei no Brasil é uma construção subjetiva, manipulável conforme o
interesse do poderoso de plantão.
Sobre o nefasto
papel da grande mídia. Se porta como partido, relata os fatos sem nenhuma
isenção e a partir dos seus interesses empresariais. Por isso que chamam a
mídia de PIG, o Partido da Imprensa Golpista.
Sobre tudo isso
já se argumentou, se debateu, se explicou. Até desenhar, foi desenhado. Mas
nada disso entra na cabeça de uma parcela significativa da população. Não
insisto mais que é um golpe. É um golpe, mas faz diferença agora que sabemos
qual será o resultado final?
Seja porque se
confunde oposição com deposição. Porque acham mais importante retirar quem
odeia cegamente, de quem se discorda, a qualquer custo do que respeitar a
democracia... Será que creem numa democracia de conveniência?
Seja porque não
suportam mais direitos e mais consumo dos pobres.
Seja porque o
mais importante e voltarmos aos tempos em que cada um sabia qual era o seu
devido lugar...
Os argumentos e a
razão jurídica nada mais têm a dizer. Aliás desde o início nunca tiveram nada a
dizer.
Porque era um
julgamento político, e não jurídico.
Pouco importa se
existe culpa.
Pouco importa se
pedalou ou não.
Pouco importa se
é corrupta ou não.
O resultado já
era sabido antes de começar a partida. Jogo de cartas marcadas. O importante
era legitimar, justificar a prévia condenação.
Ela se enrolou em
algumas respostas e sua oratória sempre foi truncada? Sim.
Os governos de
Dilma foram péssimos? Sim.
Ela fez em parte
muito daquilo que hoje quem se coloca contra essa farsa toda critica? Sim.
Sua base de apoio
era composta por aqueles que lhe usurparam o poder? Também.
Mas ela foi
eleita por 54 milhões de brasileiros. Não deveria bastar? Na democracia,
governo ruins não deveriam ser mudados pela força do voto?
Porém, do Circo
dos Horrores de 17 de abril, em que o país conheceu o picadeiro pelo qual
desfilaram tristes palhaços que a sociedade mesma elegeu; até o Teatro do
Absurdo (encenada por um bando que em nada deixa a dever a Cosa Nostra, mas que
por aqui foram eleitos senadores da república) de hoje, o certo era que a condenação
de Dilma e seu definitivo impedimento não era mais que a crônica de uma morte
anunciada.
Só uma coisa
poderia ter impedido isso: uma grande comoção nacional contra essa corja do
PMDB, coisa que não aconteceu. E não aconteceu por três motivos:
Não aconteceu
porque o PT, apesar dos avanços e das conquistas que melhoraram a vida de
milhões de pessoas, promoveu uma economia que minimizou essas melhorias quando
a crise chegou, em 2015. Além disso o PT fez vista grossa com a corrupção dos
seus aliados. Como disse um amigo querido (e petista): "Isso tudo está
acontecendo não somente pelos inúmeros acertos do PT, mas principalmente pelos
erros que o PT cometeu".
Apesar da
liberdade de investigação.
Apesar da maioria
dos petistas serem pessoas honestas.
Não aconteceu
porque a denúncia do golpe contagiou apenas a quem tem um mínimo de consciência
crítica ou exerce algum tipo de militância. Falamos para nós mesmos. Não
podemos deixar as ruas em tão grave momento. Conseguiremos reverter um quadro
que a própria razão não conseguiu?
A classe média
que foi as ruas com a elite nacional até botou mais gente, mas também não
chegou a 5% da população no total. A divisão do país opôs muita gente. Mas essa
gente toda não representa nem a décima parte dos brasileiros. Os que mais
sofrerão com o desgoverno Temer não tomaram partido. Quando tomarão? Será que
farão alguma opção?
Não aconteceu
porque o campo progressista, os movimentos sociais, as pessoas com um mínimo de
juízo crítico foram incapazes de convencer e contagiar o "povão".
Este não pode estar na luta política cotidiana porque em parte não se vê
representado nela. Por outro lado não se identificaram também naqueles que
estiveram protestando us(urp)ando as cores da bandeira. Ninguém faz protesto
junto com o patrão...
Mas também o povão
não vai para ato, protesto ou caminhada em dia de semana porque precisa chegar
rápido em casa, antes que a "chapa esquente". E porque no dia
seguinte começa sua luta mais importante, a pelo pão de cada dia. E nas
periferias e morros Brasil afora, a cidadania plena e a Justiça há muito não
existem para eles...
Fazemos educação
de base, estamos nas periferias, mas não percebemos que precisávamos de um
rápido poder de mobilização, incompatível por hora, com o "trabalho de
formiguinha" típico da educação popular. Aqui, perdemos a batalha.
Por fim, quando a
separação de um casal de jornalistas mobiliza mais gente nas redes sociais que
a mais séria, grave e tensa ruptura política dos últimos 30 anos, aí temos um
sinal de que muita gente talvez só se dê conta do que vai acontecer quando for
muito tarde para voltar atrás...
O que nos resta
fazer? Como diria Drummond: "E agora, José?"
Um comentário:
Agora é resistir... Juntar os cacos, trocar o motor do avião em pleno voo e principalmente: descobrir onde erramos...
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